Preservação e identidade: Festa da Padroeira de Arapiraca é reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial de AL

Por Erick Balbino/7Segundos |

A cultura popular, quando resiste ao tempo, transforma-se em identidade. E é exatamente isso que a Festa de Nossa Senhora do Bom Conselho representa para Arapiraca. Foi publicada no Diário Oficial da Assembleia Legislativa de Alagoas da última sexta-afeira (22), a Lei Estadual nº 9.628/2025, que reconhece oficialmente a tradicional celebração como Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial do Estado de Alagoas.

A lei estabelece que a festividade, realizada anualmente entre os dias 24 de janeiro e 2 de fevereiro, é portadora de referência à identidade, à memória e à fé do povo arapiraquense e de todo o Agreste alagoano. O texto se baseia no artigo 216 da Constituição Federal, que define como patrimônio cultural “os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”.

Além de ser simbólico, o reconhecimento estadual fortalece o direito à preservação da memória coletiva e permite que o poder público desenvolva políticas de salvaguarda e valorização da manifestação, que é uma das maiores expressões de fé do povo arapiraquense e do Agreste alagoano.

RAÍZES HISTÓRICAS: COMO TUDO COMEÇOU

A história da imagem de Nossa Senhora do Bom Conselho padroeira de Arapiraca está ligada a história da cidade mais importante do interior do Estado. 

Segundo historiadores, a história, a primeira imagem da Santa, que na verdade se trata de Nossa Senhora da Guia, foi trazida a cavalo pelo fundador do município, Manoel André no ano de 1844, de acordo com relatos do historiador arapiraquense Zezito Guedes.

A festa cresceu com Arapiraca. Desde sua elevação à condição de paróquia, em 1949, até os dias atuais, a celebração ganhou novas dimensões, tornando-se um dos maiores eventos religiosos e culturais do interior nordestino. Além da programação litúrgica, que inclui novenas, missas campais e procissões, a festividade também passou a contar com eventos sociais, culturais e esportivos, como apresentações musicais, leilões beneficentes, shows católicos e atividades recreativas.

  • A FESTA HOJE: FÉ, CULTURA E MOVIMENTO

    Atualmente, a Festa da Padroeira é um dos maiores eventos religiosos do estado de Alagoas. Organizada pela Paróquia Nossa Senhora do Bom Conselho, com apoio da Prefeitura de Arapiraca e da Associação dos Criadores de Cavalos de Sela de Arapiraca (Acesa), a programação se estende por dez dias, com novenas, celebrações eucarísticas, missas campais, procissões, leilões, shows artísticos e apresentações culturais.

    Em paralelo, são realizadas ações sociais, como atendimento médico gratuito, campanhas de arrecadação de alimentos, doações de sangue e atividades voltadas para crianças e idosos.

    O evento atrai milhares de fiéis, romeiros e turistas todos os anos. Segundo dados da Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Lazer, mais de 70 mil pessoas participaram das atividades da edição de 2024. O comércio local e a rede hoteleira registram crescimento expressivo durante o período da festa.

    “É um momento de fé, mas também de reencontro. Muita gente que mora fora volta para Arapiraca nessa época. É como se a cidade parasse para se lembrar de quem ela é,” contou Dona Lourdes da Silva, devota de 84 anos, moradora do bairro Cacimbas, em entrevista ao portal da Prefeitura.

  • Um dos pontos altos da festa é a Cavalgada de Nossa Senhora do Bom Conselho, promovida pela ACESA. O cortejo equestre reencena o percurso original feito por Manoel André em 1864, partindo de Bom Conselho (PE) e chegando a Arapiraca após cerca de 80 km de estrada de barro, trilhas e zonas rurais. A cavalgada dura dois dias e é marcada por intensa devoção, cânticos, orações e emoção.

    Cavaleiros, amazonas, vaqueiros, carros de boi e famílias inteiras se juntam ao cortejo, que é recebido com festa na entrada da cidade. A chegada da imagem da padroeira, montada num altar improvisado sobre um cavalo adornado, é acompanhada por aplausos, lágrimas e queima de fogos.

    “Participar da cavalgada é como fazer parte da história viva de Arapiraca. A gente sente que está pisando no mesmo chão que Manoel André pisou, trazendo a fé no peito e a imagem no coração,” disse João Paulo Lins.

PROJETO DE LEI FEDERAL QUER INCLUIR FESTA NO CALENDÁRIO TURÍSTICO DO BRASIL

Enquanto o reconhecimento estadual já é realidade, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4.967/2024, de autoria do deputado federal Daniel Barbosa (AL), que pretende incluir a Festa de Nossa Senhora do Bom Conselho no Calendário Turístico Oficial do Brasil.

A proposta visa ampliar o alcance da festividade, fomentar o turismo religioso nacional e fortalecer a economia da região do Agreste alagoano.

“A Festa de Nossa Senhora do Bom Conselho vai além de uma celebração da fé, também é um motor de desenvolvimento para Arapiraca e toda a região do Agreste. Colocar esse evento no Calendário Turístico Oficial do Brasil é reconhecer sua importância cultural e atrair visitantes de todo o país, fortalecendo nossa economia e o turismo regional,” destacou o parlamentar.

Caso aprovada, a lei federal permitirá a captação de recursos federais e maior divulgação em canais oficiais de turismo, potencializando investimentos e atraindo romarias de todo o Brasil.

Deputado Daniel Barbosa, autor do projeto de lei federal (Foto: Pablício Vieira/Ascom Arapiraca)

O reconhecimento como Patrimônio Cultural Imaterial abre caminhos para políticas de preservação, registro e transmissão intergeracional da tradição. A festa passa a ser, legalmente, parte do que se entende como memória coletiva do povo alagoano, com valor simbólico, espiritual e histórico.

Especialistas em patrimônio cultural destacam que a oficialização também estimula a educação patrimonial nas escolas, o envolvimento das novas gerações e o fortalecimento das manifestações populares.